quarta-feira, 21 de setembro de 2011

À espera de uma dádiva de vida - ( c/Testemunhos de Sandra Campos e da Hepaturix)

Foto: Getty

TRANSPLANTES

À espera de uma dádiva de vida

20 | 09 | 2011   10.55H
Com a crise em vista, responsável pelo corte nos incentivos aos transplantes, doentes e especialistas temem pelo futuro. Portugal é um dos líderes nesta área. Ministério garante que números não vão baixar.
Carla Marina Mendes | cmendes@destak.pt
«O transplante é a porta para novas esperanças, novas aventuras», confirma Olivier Coustere, presidente da World Transplant Game Federation e três vezes transplan-tado de rim. Em Glasgow, na Escócia, durante o congresso da Sociedade Europeia para o Transplante de Órgãos, onde o Destak esteve presente, contou como, aos 15 anos, teve de enfrentar o diagnóstico de doença renal crónica. Cinco anos depois fazia o primeiro transplante e, depois dele, o segundo e ainda um terceiro. Não esconde, por isso, o sentimento de gratidão. E alívio. É que, em Dezembro de 2009, mais de 50 mil pessoas na Europa precisavam de um transplante de rim.
Na mesma altura, segundo os dados disponíveis, contavam--se apenas 17 886 transplantes realizados. E 1630 pessoas que perderam a vida na lista de espera. «O transplante é sobre vida ou morte», reforça. E hoje muita coisa mudou. Sandra Campos concorda. Teve direito a uma segunda vida, como lhe chama, a 9 de Maio de 2005. Foi nesse dia que, num hospital da Corunha, recebeu um transplante de pulmões, um novo fôlego depois de anos presa às dificuldades respiratórias. Mas a crise, que hoje obriga os portugueses a apertar o cinto, preocupa-a, assim como os anunciados cortes nos incentivos à área da transplantação.
«As pessoas estão cheias de medo. Tenho um blogue (http://transplantes-pulmonares.blogspot.com/) e na minha caixa de e-mail já recebi mais de 200 pedidos de ajuda de quem não sabe o que fazer. Alguns já faleceram, outros não sabem como conseguir ir para fora, como eu fui, e contam-me os muitos obstáculos e dificuldades que têm de enfrentar», revela ao Destak.
O receio é partilhado pela Hepaturix - Associação de Crianças e Jovens Transplantados ou com Doenças Hepáticas que, em carta aberta, já deixou o alerta: o corte pode «sabotar» a actividade. «Ainda estamos a tempo de não cometer um crime no que à Transplantação Hepática Pediátrica diz respeito», reforça.
Apoio à colheita
O Ministério da Saúde, quer através do ministro, quer ainda do secretário de Estado, já deixou claro que esta redução, em 50% nos incentivos ao transplante e à colheita, não significa uma diminuição do número de transplantes. «A política em nada deve comprometer o número de doentes transplantados», reforça aoDestak fonte do gabinete.
Maria João Aguiar, que foi coordenadora nacional das Unidades de Colheita de Órgãos, Tecidos e Células para Transplantação, tendo apresentado a demissão recentemente, também não acredita nesse cenário, mas lamenta a forma como foi tomada a decisão. «Em cinco anos pusemos o País à frente do pelotão no que diz respeito aos transplantes. E é verdade que todos temos de compreender que é preciso fazer cortes. Mas a nossa demissão não foi por causa dos cortes nos incentivos aos transplantes, que até podiam ser muito necessários. Não concordamos é com o corte de 50% nos incentivos à colheita», explica.
É que sem órgãos não se podem fazer transplantes. Uma premissa que pode parecer básica, mas que muitos tendem a esquecer. «É preciso ter em conta as equipas que fazem com que a colheita se realize, que os dadores não entrem em colapso, que preparam as famílias. O que falta é uma palavra de apreço para estes, o reconhecimento de que o seu esforço é de interesse público.»
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Qualidade de vida tornou-se prioridade
«O transplante é sobre vida ou morte», reforça Olivier Coustere. E, hoje, muita coisa mudou. «O objectivo é devolver às pessoas uma vida normal», acrescenta. E é nesse sentido que tem também progredido a investigação, que procura medicamentos que tornem mais fácil a vida dos doentes. Isto porque muitos transplantados de rim continuam a morrer, não só devido aos clássicos problemas de rejeição, mas também a acidentes cardiovasculares.
«E a introdução de novos imunossupressores, apesar de ter contribuído para reduzir os números da rejeição aguda, não veio trazer melhorias neste aspecto», confirma Josep Grinyó, director do serviço de Nefrologia do Hospital Universitário de Bellvitge, em Espanha.
Se é um facto que é necessário manter baixo o risco de rejeição, é também importante ter em atenção outros factores que contribuem para a morte dos doentes.«Não só temos de aumentar a esperança de vida do enxerto, como do doente», reforça. «E durante anos tivemos de usar medicamentos que aumentavam o risco cardiovascular.»
É para tentar mudar este cenário que foi aprovado, na Europa e nos EUA, um novo medicamento, biológico, «que oferece protecção nefrológica», confirma Klemens Budde, director do serviço de transplantação do Charité Universitatsmedizin, na Alemanha. Chama-se belatacep e oferece uma protecção contra a rejeição do órgão, ao mesmo tempo que ajuda a preservar a função renal, que influencia o risco cardiovascular.
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Cento e quatro mil intervenções em 2010
Dados divulgados recentemente pelo Registo Mundial de Transplantes dão conta de que, em 2010, foram realizados em todo o mundo 104 065 transplantes, uma subida de quase 4% em relação ao ano anterior. No topo da lista dos órgãos que mais foram transplantados destacam-se o rim (71 418), seguido do fígado (21 207), do coração (5403), do pulmão (3649) e ainda do pâncreas (2316).
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CONVERSA RÁPIDA
Com Josep Grinyó, Director do serviço de Nefrologia do Hospital Universitário de Bellvitge, em Espanha.
Acredita que a crise pode ter impacto na área da transplantação?
Acredito que não vai haver um impacto directo a curto prazo. Mas com as dificuldades e com o crescimento da pobreza, todas as doenças aumentam - as doenças infecciosas, as cardiovasculares. Por isso, sou moderadamente expectante, mas não posso dizer que estou optimista.
Espanha é líder na área da transplantação? A que se deve este sucesso?
Foi graças a uma organização sistemática da detecção dos doadores, dos centros, da figura do coordenador de transplantes, essencial para detectar os potenciais dadores de uma forma prospectiva, e ainda devido a uma organização a nível territorial. Por outro lado, houve uma lei que introduziu o consentimento informado, que facilita os trâmites administrativos para fazer a doação.
Todas as pessoas são potenciais dadores em Espanha?
Sim, segundo a lei, mas há um decreto que regula a vontade do dador. Ou seja, é uma lei de consentimento informado, mas atenuada pelo decreto, o que nos faz respeitar a vontade da família. Sempre se fez assim, sendo ainda muito importante manter um ambiente de confidencialidade na doação de órgãos, para não criar insegurança na sociedade. E a sociedade tem respondido bem.
Têm os problemas renais vindo a aumentar?
Aumentaram, mas a incidência estabilizou-se devido a uma intervenção terapêutica de primeira linha, a um melhor controlo dos doentes nos cuidados primários, que é muito importante para controlar a progressão da doença.
Mas continua a haver muita gente à espera de um rim para transplante. Continuará a aumentar?
Sim. É por isso que, embora as pessoas estejam bastante sensibilizadas para a doação, é preciso fazer um esforço adicional junto das famílias dos doentes.
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NÚMEROS, DADOS E OUTRAS INFORMAÇÕES
Insuficiência renal afecta já 800 mil
São, todos os anos, contabilizados qualquer coisa como 2200 novos casos de insuficiência renal crónica terminal. A estes juntam-se 14 mil portugueses que dependem da diálise, dos quais cinco mil são já transplantados. A culpa é de um problema de saúde, a doença renal crónica, que ameaça tornar-se num grave problema de saúde pública.
Por cá, 800 mil sofrem com esta doença, que resulta de uma combinação de factores hereditários, aos quais se juntam ainda outras enfermidades como a diabetes, obesidade e a hipertensão arterial.
Menos 3,4% transplantes em Portugal
Depois de ter ocupado o primeiro lugar no mundo no que diz respeito aos transplantes de fígado e de rim com dador cadáver, Portugal foi ultrapassado este ano pela Croácia. De acordo com os dados referentes à primeira metade de 2011, o número de transplantes desceu 3,4% no nosso país em relação ao período homólogo, o que significa que se realizaram menos 15. Quanto à colheita de órgãos realizada a nível nacional, sofreu uma queda de 1,3% para 156, menos três do que no primeiro semestre de 2010.
Formação na Europa custa 270 mil euros
A formação de coordenadores hospitalares em toda a Europa surge como uma das principais actividades que integram o Plano de Acção 2009-2015, que acompanha a directiva europeia sobre qualidade e segurança dos transplantes.
Uma directiva aprovada durante o ano passado, que visa sobretudo melhorar o acesso aos transplantes de cerca de meio milhão de europeus.
O projecto de formação, ao qual foi dada a verba de 270 mil euros, está a ser liderado pela Espanha.
Rim traficado pode valer 200 mil dólares
As histórias multiplicam-se e, embora sejam diferentes os protagonistas, mantêm os mesmos denominadores comuns: ilegalidade, corrupção e horror. O negócio do tráfico de órgãos tem florescido, com valores que chegaram aos 50 milhões de dólares em 2008, com base nos dados da Plataforma Europeia para os Aspectos Éticos, Legais e Psicossociais da Transplantação de Órgãos.
Segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2007 esta actividade correspondia entre 5% a 10% dos transplantes de rim realizados no mundo. «Há organizações criminosas que conseguem os rins para transplante», confirmou Luc Noel, da OMS. «Mas na maior parte dos casos, isso envolve os pobres e mais vulneráveis, dispostos a abdicar de um órgão em troca de dinheiro.» É que um órgão pode chegar a valer entre 3 mil e 15 mil dólares, sobretudo rins, que são depois vendidos por intermediários a troco de pequenas fortunas - 200 mil dólares.

Fonte: http://www.destak.pt/artigo/106544-a-espera-de-uma-dadiva-de-vida
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